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Corrupção - Promotor acredita em julgamento rápido na Publicano

Renato de Lima Castro aponta que designação de mais uma juíza para a 3ª Vara Criminal pode fazer com que ações tenham sentenças em primeira instância em oito meses

Gustavo Carneiro
Renato de Lima Castro, promotor de Defesa do Patrimônio Público
A população do Paraná tem acompanhado, desde o início do ano, a prisão de dezenas de auditores da Receita Estadual de Londrina e de Curitiba – integrantes da cúpula – sob a acusação de corrupção: exigiam vultosas propinas de empresários para deixar de fiscalizar o correto recolhimento de impostos estaduais, sobretudo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), conforme apontam as investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), iniciadas há um ano.

Quase 200 pessoas já foram acusadas, em dois processos que tramitam na 3ª Vara Criminal, de integrarem a organização criminosa, que estaria agindo há praticamente três décadas. "Talvez seja a maior organização criminosa do Paraná", avalia o promotor de Defesa do Patrimônio Público Renato de Lima Castro, que atua nas investigações da chamada Operação Publicano.

O que se pergunta, agora, é quando essas pessoas, de fato, serão punidas. Castro demonstrou otimismo. Acredita que a recente decisão do Tribunal de Justiça (TJ) de designar uma juíza auxiliar para a 3ª Vara Criminal pode fazer com que as duas ações – mesmo volumosas – sejam julgadas em primeira instância em um tempo aproximado de oito meses.

O promotor também explicou por que, a exemplo do que ocorreu com o caso AMA/Comurb (esquema de desvio de dinheiro da Prefeitura de Londrina durante o terceiro mandato do ex-prefeito Antonio Belinati - 1997-2000), o Ministério Público (MP) optou por ações únicas em vez de desmembrar o caso em vários processos.

Para ele, embora possa parecer que os auditores investigados estão em posição favorável – afinal, foram afastados dos cargos, mas não deixam de receber salários que passam de R$ 20 mil; e praticamente todos conseguiram habeas corpus para responder em liberdade os processos –, há vantagens para o Estado, que conseguiu estancar, pelo menos momentaneamente, os desvios de milhões em impostos.

Existe uma perspectiva de prazo para essas ações serem julgadas?

É muito difícil estabelecer prazo, sobretudo porque se trata de réus soltos; com réus presos geralmente o processo em primeira instância pode acabar em torno de sete meses, oito meses, até um ano. Há uma prioridade de despachos para os processos com réu preso. Essa perspectiva (de prazo) dobra na hipótese de réu solto. Esse é um processo muito volumoso, com muitos réus, o que torna a tramitação muito dificultosa.

A primeira das ações da Operação Publicano tem 73 réus; a segunda tem 125. Os processos não poderiam ter sido desmembrados?

Como se trata de uma organização criminosa, em que há uma divisão de tarefas e hierarquização, é fundamental que a prova seja produzida dentro do mesmo processo. Se no decorrer da instrução o juiz entender que é importante para a própria tramitação do processo fazer o desmembramento, isso será possível. O desmembramento é possível processualmente, mas nós optamos por uma ação penal única em decorrência de que é uma organização criminosa. A produção da prova tem muito mais coerência quando é produzida ao mesmo tempo. Porque, se cada agente público – no caso, cada auditor fiscal – contribui para a organização criminosa no sentido de solicitar ou exigir vantagem indevida dos empresários e entregar e distribuir parte dessa propina aos membros do grupo e aos superiores hierárquicos do grupo, ela tem mais força quando é produzida no mesmo processo.

Então, foi uma opção do Ministério Público?

É mais aconselhável, no âmbito de produção probatória, que a ação seja única, embora não seja impossível a divisão. É possível, mas talvez não aconselhável para o sucesso da produção probatória.

Há outras vantagens em se optar pela ação única?

Uma vantagem que eu reputo fundamental é a não repetição de oitivas (de testemunhas, réus e informantes) que interessam para o mesmo processo. Há um aproveitamento dessas declarações, que se estendem aos demais acusados. Assim, não é preciso reinquiri-las sucessivas e sucessivas vezes em datas diferentes na hipótese de serem vários processos.

O TJ atendeu parcialmente o pedido de um juiz exclusivo para a Publicano, designando mais uma juíza para a 3ª Vara Criminal. Em que medida isso ajuda?

O Tribunal de Justiça mostrou-se bastante sensível diante desse clamor da população e também do Ministério Público, porque possibilitou que a juíza auxiliar atuasse em conjunto com o juiz natural do fato, que é o doutor Juliano (Nanuncio), para possibilitar que ele tenha uma atuação mais eficaz neste processo volumoso e de grande importância para o Estado do Paraná. Sem qualquer dúvida, foi uma providência muito importante.

Com essa medida, dá para fazer um prognóstico do tempo que esses processos vão demorar para serem julgados?

Eu creio que em uns oito meses é possível, dentro dessa perspectiva, com dois juízes atuando na vara. Ser julgado em primeira instância. Aí cabe recurso ao Tribunal de Justiça e creio também ser possível dar prioridade também no Tribunal de Justiça, mas isso é uma matéria que deve ser tratada em segunda instância.

No caso AMA/Comurb, foram protocoladas ações com grande número de réus e estes processos demoraram a tramitar; alguns prescreveram. Isso deveu-se ao elevado número de requeridos? Por que tanta demora?

O Poder Judiciário brasileiro tem uma grande dificuldade de celeridade. Os processos, infelizmente, tendem para a eternização. Isso é extremamente prejudicial à prestação jurisdicional. Portanto, uma sentença tardia é uma sentença injusta, sem qualquer dúvida. As razões são várias: falta de estrutura, falta de material humano, falta de varas especializadas também nos tribunais superiores, astúcia das defesas técnicas, grande escritórios de advocacia que usam todos os meandros da lei para os recursos, e também a legislação processual admite uma infinidade de recursos. São todos esses fatores que levam a não ter um resultado rápido em todas as instâncias.

Por que esse caso – a Operação Publicano – precisa de prioridade no julgamento?

Porque talvez seja a maior organização criminosa do Paraná, que atuava dentro das nossas estruturas. De um lado, há a arrecadação, que é fundamental para que o Estado possa realizar as prestações públicas fundamentais, que são saúde, educação, moradia, assistência. Nós não podemos permitir que agentes públicos utilizem suas funções solicitando ou exigindo vantagem indevida, que estas pessoas estejam organizadas nas estruturas do Estado, com os poderes do Estado, usando deste poder para obter vantagem indevida. É certo que é uma superorganização criminosa, que é intermunicipal, também assentada em Curitiba. É preciso que tenhamos uma preocupação para reduzi-la, senão acabar com ela.

À exceção de dois, todos os auditores estão soltos. Foram afastados dos cargos públicos, mas são remunerados com salários superiores a R$ 20 mil. Até esse momento, a impressão que dá é de que compensa.

Na verdade, não compensa. Porque dentro de uma estrutura criminosa, os seus membros recebem valores muito superiores aos seus vencimentos. Então, se uma pessoa tem uma estrutura de vida em que tem um gasto de R$ 25 mil, R$ 30 mil, quando ele recebe R$ 20 mil, é certo que ele não pode ganhar R$ 20 mil. Ele tem que ganhar R$ 50 mil, R$ 80 mil, R$ 100 mil. Então, há um "empobrecimento" desse agente corrupto, e esse empobrecimento causa uma perplexidade muito grande a ele. E, de mais a mais, essa pessoa afastada possibilita que o Estado volte a arrecadar mais dinheiro, porque essa organização não está em atuação ou em plena atuação. Então, há, sim, um reflexo importante para a sociedade.

Mas vão responder os processos em liberdade.

Nós precisamos ter uma nova leitura da prisão preventiva. Ela serve para evitar a reiteração criminosa, sobretudo quando praticada por membros de uma organização criminosa que atua no Paraná inteiro, entre municípios, de uma forma sistematizada e hierarquizada. Então, é evidente que essas pessoas deveriam estar presas até o final do processo, em razão desta superorganização, desta sistematização e das reiterações criminosas que elas praticaram ao longo de décadas.

Este foi o entendimento do Tribunal de Justiça, mas não o do STJ...

Infelizmente, de uma forma bastante triste para o Estado do Paraná.

E a responsabilização administrativa, por meio dos processos disciplinares?

É fundamental que o Paraná, por intermédio do seu governo, proponha medidas urgentes de redução dos prazos de processos disciplinares para que essas pessoas sejam demitidas do cargo administrativamente. É preciso que o processo disciplinar tenha um prazo exíguo, de começo, meio e fim. Se não há uma resposta do Poder Judiciário rápida, que a administração pública possa reduzir os prazos, afastar com vencimentos reduzidos, como já vi a notícia disso, e demissões céleres. Isso é fundamental para que haja um desestímulo à corrupção. Porque a certeza da punição torna desestimuladora a corrupção. Por outro lado, a falta da certeza da punição estimula a corrupção. Nós precisamos mudar esse quadro: as pessoas precisam ser condenadas definitivamente ou absolvidas no Judiciário e administrativamente, mas de maneira mais célere. As pessoas precisam saber que há punição para crimes do colarinho branco também.

Este caso tem um fator importante que é um delator, um auditor com importante papel na organização criminosa, que admitiu diversos atos ilícitos e delatou os colegas...

A delação premiada foi fundamental para que o Ministério Público pudesse compreender, de dentro para fora, a estrutura, a sistematização, a organização, a divisão de tarefas e a hierarquização desta organização criminosa. Ele (Luiz Antônio de Souza) foi preciso na medida em que indicava o fiscal que comparecia à empresa determinada, indicava o valor que foi solicitado, a forma de pagamento, indicou também as ordens de serviço – em nome de quem estavam. Todas essas informações foram checadas e confirmadas pelo Ministério Público. Portanto, a delação premiada foi absolutamente corroborada com os documentos que nós requisitamos e com as oitivas dos empresários que foram achacados, que pagaram propina quer para se beneficiar, quer porque tinham medo dessa estrutura criminosa. É importante destacar que, nos crimes de corrupção, a delação premiada é absolutamente eficaz, porque é um crime que ocorre na clandestinidade, tanto sujeito ativo quanto sujeito passivo podem ser beneficiados, no mais das vezes. Quem recebe a propina não oferece recibo. A delação é, portanto, fundamental, e esta é a razão pela qual as defesas tanto se insurgem contra os delatores porque (ela) é muito importante e eficaz em todas as legislações mundiais.

Outro fato importante é a recuperação de dinheiro.

Um dos fundamentos da delação é a recuperação de ativos, a indicação de patrimônio e tudo mais. Isto está sendo realizado no âmbito desta operação.

Há possibilidade de outros auditores passarem a colaborar com as investigações?

Acho muito difícil. Não há interesse do Ministério Público em novas delações. Nós já estabelecemos a sistematização da organização criminosa; já conseguimos observar de dentro para fora como ela atuava e, portanto, não há qualquer interesse do Ministério Público.


Loriane Comeli
Reportagem Local-FOLHA DE LONDRINA
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