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MAIORIDADE PENAL - Infratores ou vítimas?

Em 2014, 74 adolescentes cometeram assassinatos no Paraná, enquanto 315 foram assassinados

Theo Marques
"Não dá para negar que a maioria (dos infratores) é de baixa renda e enfrenta carência tanto financeira como de acesso a serviços", constata Márcio de Alencar
Curitiba – Crianças e adolescentes são mais vítimas do que autores de crimes contra a vida no Paraná. Segundo a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp), 315 jovens de até 18 anos foram assassinados no Estado em 2014. O índice é 4,2 vezes maior do que os 74 adolescentes autores de homicídios (66) e latrocínios (8) no mesmo período – quando a Secretaria contabilizou 2.686 atos infracionais contra a vida. A divulgação dos dados, feita a pedido da FOLHA, coincide com a retomada do debate em torno da redução da maioridade penal (ver box nesta página).

Segundo a Sesp, os menores de idade foram responsáveis por 2,6%, dos 2.515 homicídios dolosos, por 0,56% dos 162.033 furtos, por 1,46% dos 62.618 roubos e por 14,97% dos 8.969 casos de tráfico de drogas. O sistema de controle da Sesp não faz distinção de gênero ou raça.

Para a presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), Maria Christina dos Santos, as estatísticas deixam claro que o Estado tem se mostrado ineficaz no que diz respeito à implementação de políticas públicas. "Ele está ausente ou é insuficiente. E não imagino que seja prioridade dos políticos discutir essa questão", afirma. A especialista cita ainda os registros feitos pela Vara de Adolescentes em Conflito com a Lei da Comarca de Curitiba. Em 2014, houve 320 mortes violentas de jovens de 12 a 21 anos. Destas vítimas, 82 (25,6%) estavam vinculadas à unidade, isto é, respondiam por algum tipo de delito.

951 nos Censes

O Paraná possui mais de 15 mil adolescentes em conflito com a lei. O governo estadual, porém, só é responsável pelo atendimento daqueles que cumprem as medidas mais restritivas, como a internação (equivalente ao regime fechado dos adultos) e a semiliberdade. As sanções consideradas mais brandas ficam a cargo dos municípios, que devem atuar de forma integrada.

Conforme a Secretaria da Justiça e Direitos Humanos (Seju), 951 jovens de 12 a 20 anos estão atualmente privados de liberdade nos 18 Centros de Socioeducação (Censes) do Estado, dos quais 895 são meninos e 56, meninas. A maioria deles cometeu assaltos (36%) ou se envolveu com tráfico de drogas (20%). Somente 14% respondem a crimes contra a vida, sendo 9% por homicídio qualificado e 5% por homicídio simples.

Dentre o total de internos, 42,3% estão envolvidos em um único processo, porcentagem que sobe para 70,2% quando se trata de pessoas do sexo feminino. Ainda segundo a Seju, 16,75% dos adolescentes internados moravam com o pai e a mãe e 29,67% conviviam apenas com a figura materna antes de serem apreendidos. Mais da metade é proveniente de famílias compostas por quatro a seis pessoas, 45% possuem renda familiar inferior a dois salários mínimos e 4% já têm filhos.

"Não queremos cair num discurso fatalista. Há também adolescentes de classe média, já que todos são seres humanos passíveis de erros. Por outro lado, não dá para negar que a maioria é de baixa renda e enfrenta carência tanto financeira como de acesso a serviços. As famílias costumam ser monoparentais, muitos são dependentes químicos e convivem com problemas como falta de emprego, evasão escolar e ociosidade", afirma o diretor-adjunto do Departamento Estadual de Atendimento Socioeducativo, Márcio Augusto Schimidt de Alencar. De acordo com ele, para uma parcela significativa da sociedade esses adolescentes só se tornam visíveis quando infringem a lei.

Estrutura

Em 2013, reportagem da FOLHA revelou que as 24 unidades avaliadas – 18 delas restritivas – foram consideradas parcialmente ou totalmente inadequadas à lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), sancionada no ano anterior. Desde então, Maria Christina diz que pouca coisa mudou. "Se o ECA fosse cumprido, certamente teríamos um percentual de reinserção social maior", opina.

Alencar reconhece que ainda há muito o que se avançar, mas destaca que várias instituições passaram por reformas e hoje oferecem cursos profissionalizantes, além de atendimento médico e inserção no mercado de trabalho. De acordo com ele, estão sendo construídos novos módulos em Toledo, Apucarana, Telêmaco Borba, Guarapuava e Pato Branco.

Em breve, Londrina receberá também o primeiro modelo-padrão do Núcleo de Atendimento Integrado (NAI) do Estado. No mesmo local, setores do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, segurança e assistência social trabalharão em conjunto, para agilizar o atendimento inicial.
Mariana Franco Ramos
Reportagem Local-folha de londrina
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