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(29-11-2015) Parananenses devem mais e não conseguem pagar as dívidas

Projeto do TJPR identificou queda no número de acordos sobre débitos de consumo, possivelmente porque os devedores não possuem fôlego financeiro para assumir parcelamentos

Marcos Santos/USP Imagens
Fácil acesso ao crédito levou muitas pessoas a se comprometerem financeiramente. Agora, mudanças na situação econômica dificultam pagamento das dívidas

Os paranaenses estão mais endividados e com menos condições de negociarem acordos relativos às dívidas. Pesquisa realizada pela Federação do Comércio do Estado do Paraná (Fecomércio) indica que o percentual de endividados com contas em atraso passou de 26% em setembro para 27,3% em outubro de 2015. No mesmo mês de 2014, o valor era de 23%. A inadimplência, ou seja, aqueles que estão com contas atrasadas há mais de 90 dias, também aumentou, passando de 45,8% em setembro para 50,8% no mês passado.
A dificuldade das famílias em honrar os compromissos financeiros acaba gerando o chamado superendividamento, descrito como a impossibilidade do devedor (pessoa física), considerado de boa fé, pagar todas as dívidas atuais e futuras de consumo em um tempo razoável e com os recursos de renda disponíveis. O Projeto de Tratamento de Superendividamento do Consumidor do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), lançado em 2010 em Curitiba, busca ajudar pessoas com esse perfil.
Para participar, é preciso ser pessoa física e ter dívidas decorrentes da relação de consumo. Após efetuar cadastro no projeto, devedor e credores se encontram em audiência realizada na Escola da Magistratura do Paraná, presidida por conciliador voluntário. Na audiência, é proposto um acordo que considere o orçamento familiar do consumidor, de modo a garantir a subsistência básica de sua família. "Caso não haja acordo, o procedimento é arquivado", explica a juíza de Direito Sandra Bauermann, coordenadora do projeto.
Em Curitiba, foram cadastrados aproximadamente 4 mil pedidos de consumidores até outubro de 2015. Nos dois primeiros anos, em torno de 70% a 80% das audiências resultaram em acordos, mas no último ano a taxa caiu para 50%. "Parte da redução do índice é reflexo da falta de capacidade de pagamento das pessoas. Os acordos precisam respeitar e preservar as despesas básicas de sobrevivência do superendividado, como por exemplo água, luz, aluguel e alimentação. O que temos constatado é que, com o aumento do custo de vida do cidadão brasileiro, a maior parte dos seus rendimentos são justamente destinados às despesas básicas de sobrevivência, pouco sobrando para pagar as dívidas", relata.
Segundo Sandra, as pessoas atendidas em geral tiveram acesso ao crédito fácil, se comprometeram financeiramente e, diante de mudanças na situação econômica pessoal – como o desemprego - e também pela conjuntura econômica do país, não conseguiram honrar os compromissos. As dívidas sempre podem ser negociadas. O problema, segundo ela, é que os conciliadores não estão conseguindo realizar mais acordos porque os devedores não têm fôlego para assumir o parcelamento das dívidas. "Não adianta fazer acordos que não serão cumpridos", pontua.

CÓDIGO DO CONSUMIDOR

A falta de capacidade dos consumidores para negociarem suas dívidas reforça a necessidade de aprovação final do Projeto de Lei (PL) do Senado 283/2012, já aprovado em 1ª votação, que atualiza o Código de Defesa do Consumidor. "O PL traz mecanismos de prevenção e tratamento do superendividamento do consumidor pessoa física", explica.
Segundo ela, o objetivo é reforçar a importância de existir mecanismos para conciliação - como já ocorre no projeto do TJPR – e também a previsão de que os processos de superendividamento tenham procedimento próprio, para que os juízes possam efetivamente resolver litígios caso não se obtenha a renegociação amigável. "A legislação atual não oferece resposta adequada para isso", adianta, lembrando que o Código de Defesa do Consumidor é de 1990, quando a realidade dos superendividados não existia.
Hoje, a situação é outra. A pesquisa da Fecomércio indicou também que, no Paraná, em outubro deste ano, 85,7% dos entrevistados possuíam dívidas, sendo 27,3% com contas em atraso e 10,9% sem condições de pagá-las. Além disso, no universo pesquisado, 26,3% das pessoas se consideram muito endividados com relação a cheques pré-datados, cartões de crédito, carnês de lojas, empréstimo pessoal, prestação de carro e seguro. Outros 40,7% declararam-se mais ou menos endividados, indicando que a maioria dos paranaenses encontra-se comprometido com dívidas de consumo. Outro dado preocupante é que 40% das pessoas disseram que não teriam condições de pagar as contas atrasadas no mês seguinte às entrevistas.
"O crédito estava muito facilitado, o que incita o consumo exagerado", lamenta Sandra. Segundo ela, quando as condições de compra são facilitadas, as pessoas acreditam que vão poder honrar as dívidas, mas aí a economia muda ou acontece algum fato negativo na vida e a capacidade de pagamento desaparece, gerando o superendividamento. "Os brasileiros precisam receber educação financeira, entender que é importante ter uma reserva para as emergências", ensina.
Carolina Avansini
Reportagem Local-FOLHA DE LONDRINA
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