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(01-11-2015) RELACIONAMENTO - Abandono afetivo na mira da Justiça

As consequências dos conflitos pós-separação podem ser nefastas para os filhos. Londrina é pioneira no PR na oferta de oficinas de parentalidade


A Justiça brasileira começa a se mobilizar para sanar um problema que ainda é comum entre famílias de todas as classes sociais e regiões do País. Com o fim do relacionamento entre um casal, uma das partes deixa de oferecer cuidado e atenção aos filhos que tiveram juntos, praticando o chamado abandono afetivo parental. A prática também ocorre entre casais que geraram o filho mas nunca tiveram um relacionamento. Alienação parental, não reconhecimento dos filhos e até mesmo o pagamento da pensão alimentícia são outros conflitos decorrentes de relacionamentos conflituosos entre casais. Especialistas ouvidos pela FOLHA informam que o abandono afetivo é praticado pelos pais, na maioria dos casos, apesar de haver também situações envolvendo as mães.
Diante do reconhecimento do prejuízo que a falta de entendimento entre os pais causa às crianças e adolescentes, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomendou uma série de ações, em resolução publicada no ano passado, que resultaram na instituição da Política Nacional de Conciliação. Entre as iniciativas recomendadas, está a adoção de oficinas de parentalidade como política pública na resolução e prevenção de conflitos familiares. Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 30% das uniões no Brasil terminam em separação.
No Paraná, Londrina é pioneira na realização do programa Oficina de Pais, que funciona há mais de sete meses na cidade, através do Centro Judiciário de Soluções de Conflitos e Cidadania (CEJUSC). Sob a coordenação da juíza Fabiana Leonel Ayres Bressan, o projeto atende pais com conflitos jurídicos envolvendo o fim do relacionamento, como divórcio ou dissolução da união estável, e tem como objetivo fortalecê-los a manter uma relação parental saudável com os filhos em comum.
Outro caminho tomado pela Justiça para proteger crianças e adolescentes é o reconhecimento da possibilidade de entrar com ação indenizatória por danos morais contra o genitor que pratica o abandono afetivo. A promotora de justiça Swami Mougenoet Bonfim, da Promotoria de Justiça das Comunidades, em Curitiba, explica que o abandono é um instituto que ainda não tem legislação específica para disciplinar. "Essa conduta vem ganhando atenção dos operadores de direito por ser complementar em questões que ocorrem entre filhos e pais separados, seja pelo divórcio ou porque nunca tiveram uma convivência juntos", afirma.
Segundo ela, a lei não impõe a ninguém o dever de amar, mas vai impor deveres obrigacionais levando em conta que uma criança tem o direito à companhia do pai e à convivência familiar saudável. A promotora defende que, oficialmente, deve haver uma punição a quem pratica o abandono afetivo. "Defendo a imposição de uma indenização que ofereça recursos financeiros para diminuir a angústia, a dor, o sentimento de rejeição que é muito forte, e todas as consequências psicológicas e sociais que essa ausência acarreta", argumenta.

Oficinas

Em Londrina, a psicóloga Silvia Fraia é a responsável por ministrar as oficinas de pais no centro de soluções de conflitos do Fórum. Ela, que presta o serviço voluntariamente, explica que a iniciativa visa atender a recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Nas oficinas, Sílvia tenta conscientizar os pais de que os conflitos são normais nos processos de separação, mas não podem ser estendidos aos filhos. "O objetivo é fazê-los compreender que, quando deixam de ser um casal, precisam trabalhar a relação parental", avalia.
Como os filhos quase sempre são o pivô dos conflitos pós-separação - ou mesmo entre pais e mães que nunca tiveram um relacionamento –, eles acabam achando que são culpados. "Muitas vezes os pais e mães usam os filhos como arma, o que fica bem evidente nos casos de alienação parental, quando um dos lados desqualifica o outro. Isso já tem punição prevista na lei, inclusive com risco de perder a guarda", esclarece.
As oficinas não visam aconselhar ou resolver conflitos particulares, apesar de serem oferecidas a pessoas que já estão envolvidas em processos judiciais. "A ideia é que seja um espaço de conscientização sobre parentalidade, onde os pais e mães possam reconhecer sentimentos e trocar experiências", esclarece. As sessões ocorrem em grupo e não reúnem partes em conflito.
Silvia destaca que as consequências dos conflitos podem ser nefastas para crianças e adolescentes. Segundo ela, após a separação, os filhos tendem a negar o ocorrido e depois, quando percebem que é inevitável, ficam com raiva pelo sofrimento causado por pessoas que amam. Em seguida, é normal que os filhos se achem capazes de fazer os pais reatarem o relacionamento, o que não acontece na maioria das vezes. "Se a criança ou o adolescente não elabora esses sentimentos, é possível que desenvolva depressão", lamenta ela, lembrando que outro comportamento frequente é a revolta. "Muitos adolescentes chegam a praticar automutilação", alerta, adiantando que o próximo passo do programa é oferecer, em Londrina, oficinas para ajudar crianças e adolescentes a lidarem com a questão.

FOLHA DE LONDRINA
Carolina Avansini
Reportagem Local
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