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POLÊMICA - Retrocesso no combate à corrupção

Lideranças receberam com "estranhamento" a posição do Supremo Tribunal Federal, já que a Lei da Ficha Limpa foi decorrente de iniciativa popular

Uma decisão tomada às pressas – e cercada de polêmicas – pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ameaça a eficácia da Lei da Ficha Limpa, aprovada em 2010 por iniciativa popular e que torna inelegíveis os candidatos a cargos públicos cujas contas de gestão foram desaprovadas pelos Tribunais de Contas (TC) a que foram submetidas. O entendimento do STF é que a competência de julgar as contas dos prefeitos que atuam na condição de ordenadores de despesas, ou seja, que autorizam o gasto do dinheiro público, é da Câmara de Vereadores e não dos tribunais. Na prática, significa que aproximadamente 6 mil prefeitos que são candidatos à reeleição – e cujas contas foram reprovadas pelo Tribunal de Contas – poderão concorrer novamente ao cargo no pleito deste ano caso as câmaras aprovem a gestão dos recursos.
"É um retrocesso enorme em relação ao combate à corrupção", considera Luciano Santos, advogado especialista em direito eleitoral e diretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). Segundo ele, o texto original da Ficha Limpa foi aprovado na Câmara, no Senado, recebeu sanção do presidente da república e foi referendado pelo próprio STF. "É uma lei legítima, as pessoas não estavam bêbadas quando aprovaram", ironizou ele, referindo-se à declaração do ministro Gilmar Mendes, do STF, que afirmou que a Lei da Ficha Limpa parece ter sido "feita por bêbados". A afirmação foi proferida durante sessão da Corte que analisou decisão sobre contas rejeitadas de prefeitos que são candidatos às eleições.
A polêmica que resultou na mudança na lei diz respeito ao entendimento sobre contas de governo e contas de gestão. Santos explica que as contas de governo são aquelas fiscalizadas pelo TC para checar se houve investimentos mínimos em saúde ou educação, por exemplo. "São decisões políticas, por isso, a aprovação ou não já tinha que ser submetida às casas legislativas", esclarece.
Já as contas de gestão são importantes principalmente nas cidades menores onde o ordenador das despesas é o próprio prefeito, que nas palavras do advogado, "administra com o talão de cheques da prefeitura no bolso". "Ele paga contas, homologa licitações e concursos, enfim, concentra o poder na mão dele", diz, lembrando que outros agentes públicos, como secretários de finanças, também podem ser ordenadores de despesas.
Santos destaca que o entendimento do Supremo, até então, é que bastava a reprovação das contas de gestão pelo Tribunal de Contas, que é o órgão técnico, para tornar o prefeito inelegível. "Isso consta na legislação eleitoral e está reforçada na Lei da Ficha Limpa, que aumentou o prazo da inelegibilidade de três para oito anos. O próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vinha utilizando essas regras", aponta.
Agora, após a votação do STF, as contas de gestão também precisarão passar pelo crivo da Câmara de Vereadores, que poderá aprovar as contas apesar de decisão desfavorável do Tribunal de Contas. "A consequência é que essa mudança concentra um poder muito grande nas mãos dos vereadores", critica, lembrando que em relação às contas de governo, já há muitos casos em que o ex-prefeito é candidato, tem contas desaprovadas, mas é do mesmo partido do presidente da Câmara que acaba não promovendo a votação das contas para proteger o candidato de se tornar inelegível. "Isso já acontece em relação às contas de governo e passará a acontecer com contas de gestão por jogo político", lamenta Santos, lembrando que mais de 80% dos casos de inelegibilidade se referem a rejeição de contas públicas.

Faltou debate

O diretor do MCCE entende que o STF deve ter sido pressionado pela horda de candidatos em risco de perderem o direito de disputar as eleições. "Foi um julgamento muito rápido, que não oportunizou um debate da sociedade sobre a lei", diz.
O assunto, porém, não está encerrado. Santos esclarece que as entidades que defendem a Lei da Ficha Limpa, incluindo Tribunais de Conta e Ministério Público, tiveram uma reunião com o procurador geral da República Rodrigo Janot e pediram o ajuizamento de recurso através dos embargos sobre os quais o STF terá que se manifestar. "A tentativa é de mudar um voto para reverter o quadro da decisão", espera.
Os embargos só podem ser feitos após a publicação do acordão, o que ainda não aconteceu. Teoricamente, o STF não tem prazo para julgá-los, por isso é mínima a possibilidade de que nova decisão ocorra antes das eleições municipais. "Isso traz uma insegurança política muito grande e cria um ambiente muito ruim para o processo eleitoral. Esperamos que haja movimentação nas redes sociais para que pessoas que defenderam a Lei da Ficha Limpa pressionem o Supremo", avisa.
Carolina Avansini
Reportagem Local/folha de londrina

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