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Pobreza atinge 61% das crianças e adolescentes brasileiros

Órfãos de pai e abandonados pela mãe, os adolescentes vivem sozinhos em um barraco sem infraestrutura: "É sofrido acordar de manhã e não ter o que comer, mas meu pai ensinou a trabalhar e correr atrás, então a gente vai se virando."

Seis a cada dez crianças e adolescentes brasileiros vivem na pobreza. Muito além da privação monetária, o País concentra 61% de meninos e meninas de até 17 anos de idade sem acesso à educação, informação, proteção contra o trabalho infantil, moradia, água e saneamento - direitos fundamentais garantidos por dispositivos legais. São 32 milhões de pessoas nessa faixa etária imersas na pobreza em suas múltiplas variações. Os números estão no estudo Pobreza na Infância e na Adolescência, divulgado nesta terça-feira (14) pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), que tomou como base os dados da Pnad 2015 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).

O estudo apurou que seis milhões de crianças e adolescentes são afetados apenas pela pobreza monetária. Outros 12 milhões, além de ter renda per capita insuficiente para adquirir uma cesta básica de bens, têm um ou mais direitos negados. E há ainda 14 milhões de meninos e meninas que, embora não possam ser considerados pobres do ponto de vista financeiro, têm um ou mais direitos negados. O Unicef defende que, para entender a pobreza, é preciso avaliar muito mais do que simplesmente a condição econômica. Considerando que os direitos garantidos a essa população são indivisíveis, a ausência de um ou mais deles constitui uma situação de "privação múltipla" e coloca em risco o bem-estar dessas pessoas.

Por isso, o Unicef calcula que o percentual de brasileiros pobres na faixa etária de zero a 17 anos ultrapasse os 60%. E os mais afetados são os negros, os moradores da zona rural e a população das regiões Norte e Nordeste do País. "Incluir a privação de direitos como uma das faces da pobreza não é comum nas análises tradicionais sobre o tema, mas é essencial para dar destaque ao conjunto dos problemas graves que afetam as possibilidades de meninas e meninos desenvolverem o seu potencial e garantir o seu bem-estar", explicou a representante do Unicef no Brasil, Florence Bauer, por meio de nota divulgada pelo Fundo à imprensa.

Em uma favela da zona norte de Londrina, dois irmãos, de 16 e 13 anos de idade, conhecem bem a realidade traçada pelo estudo do Unicef. Órfãos de pai e abandonados pela mãe, há três anos os adolescentes vivem sozinhos em um barraco de dois cômodos quase sem nenhuma infraestrutura. O pequeno espaço, dividido em sala e quarto, acomoda um sofá, um armário, um fogão sem botijão, uma cama e uma televisão. Não há banheiro, apenas uma torneira que pinga constantemente sobre o piso da sala.

O mais velho estudou até a oitava série. O mais novo parou no quarto ano. Eles têm vontade de voltar para a escola, mas falta a documentação para a matrícula. O pouco dinheiro que ganham vem de pequenos serviços, como o trabalho de carroceiro que fazem com um cavalo emprestado. Os irmãos também contam com a ajuda da comunidade. "É sofrido acordar de manhã e não ter o que comer", resume o mais velho. "Mas meu pai ensinou a trabalhar e correr atrás, então a gente vai se virando."

O adolescente de 16 anos diz que é "triste viver sozinho no mundo" e emenda: "minha vida daria um filme". Um drama cujo roteiro foi sendo definido pelas lacunas criadas pelo poder público. A cada direito negado aos dois irmãos, é acrescido um degrau à escada da pirâmide social, aumentando a distância entre a base e o topo.

A Seds (Secretaria da Família e Desenvolvimento Social do Estado do Paraná) reconhece que a situação das crianças e adolescentes paranaenses está longe do ideal, mas destaca os dados da própria Pnad 2015 para comprovar a situação favorável do Estado no cenário nacional. Segundo o superintendente da Política de Garantia de Direitos da secretaria, Leandro Meller, 24,5% da população de zero a 14 anos de idade têm renda de até meio salário mínimo, o que coloca o Paraná na quarta colocação no ranking brasileiro, atrás de Santa Catarina (17,7%), Distrito Federal (20,2%) e São Paulo (21,2%). Alagoas tem o pior índice: 66%. "Não é o ideal, a meta é erradicar a pobreza, mas comparado com outros Estados e outras realidades, o Paraná e a Região Sul estão bem", avalia Meller.

O superintendente destaca avanços na garantia de direitos e investimentos em projetos direcionados à infância e à adolescência. No ano passado, os recursos estaduais para aprendizagem, qualificação profissional, enfrentamento à drogadição, à violência e fortalecimento de vínculos familiares consumiram mais de R$ 57 milhões. Outros R$ 27,5 milhões foram liberados por meio de editais para apoiar entidades que trabalham com políticas de crianças e adolescentes. Para este ano, está prevista a liberação de R$ 23 milhões para o fortalecimento dos 424 conselhos tutelares do Estado.

Em dois anos, são pelo menos R$ 107 milhões em repasses estaduais que ainda não foram suficientes para mudar muitas realidades, como a dos dois irmãos que vivem na favela na zona norte de Londrina.

"A distribuição de recursos não é aleatória. Ela é feita de acordo com a demanda e necessidade", explicou Meller. Os municípios também têm que atender algumas exigências, como ter políticas públicas, conselho da criança e do adolescente implantado e plano municipal dos direitos da criança e do adolescente. A prestação de contas e a fiscalização da aplicação de recursos, segundo o superintendente, é de competência dos conselhos municipal e estadual da criança e do adolescente, Tribunal de Contas e Ministério Público.


Simoni Saris
Reportagem Local/FOLHA DE LONDRINA


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