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Crise na Seara deixa agricultores apreensivos


Cerca de 10% da produção de soja do município foi comercializada com a Seara, estimam produtores


O pedido de recuperação judicial impetrado pela Seara Indústria e Comércio de Produtos Agropecuários, com sede em Sertanópolis (Região Metropolitana de Londrina) pegou os agricultores de surpresa. Sem receber os valores da soja negociada com a empresa os produtores estão preocupados com as dívidas desta safra e em como conseguir crédito para o custeio da próxima.
Em Bela Vista do Paraíso (Região Metropolitana de Londrina), cerca de 10% da produção de soja do município foi comercializada com a Seara. "Aqui, são quatro empresas que recebem soja. Eles (Seara), acredito que recebia em torno de 10%", disse o agricultor João Dimas Pozzobon, de 63 anos.
Ele entregou quase 2,1 mil sacas de soja para a Seara. "Em vista da solidez que pensávamos que a firma tinha, muitos produtores deixavam a soja de um ano para o outro. Para muitos era como uma poupança. Em vez de colocar no banco, o produtor deixava na empresa", explicou Pozzobon. Foi o caso do produtor Faustino Urbano, de 74 anos, que tem em torno de 400 sacas para receber, que foram entregues há três anos.
De acordo com os agricultores, a situação deve gerar uma grave crise econômica no campo e muitos não têm condições de absorver o prejuízo. "O maior problema é o pequeno produtor", afirmou Urbano. Com as dívidas chegando, a maioria dos compromissos dos agricultores venceu dia 30 de abril, a preocupação é como financiar a próxima safra. "Vai ser complicado fazer uma renegociação do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), a não ser que abram uma exceção. Se eu não pagar a minha dívida é perigoso não me liberarem o próximo financiamento. E, para pegar dinheiro de terceiros, o juro é absurdo", comentou Evandro Luis Augustineti, de 39 anos.
Ele negociou mais de 1.200 sacas de soja um dia antes do pedido de recuperação judicial, mas não recebeu o valor devido. "Eles ligaram para irmos lá fechar a soja. Todo mundo fechou, mas ninguém recebeu", contou Evandro. O prejuízo só não foi maior, porque Augustineti costuma dividir a produção entre duas ou três empresas. "Conversei com um produtor que entregou 12 mil sacas. Ele estava a beira de ter um AVC (acidente vascular cerebral) de tão nervoso", comentou.
Os produtores estão inseguros sobre onde depositar os grãos das próximas safras. "Conversando com agricultores que não foram lesados, a preocupação é que, hoje foi a Seara, e amanhã pode ser outro. Estamos ficando sem opção de para quem entregar. Já tivemos duas cooperativas na região e ambas deixaram de existir. Não temos mais segurança em quem depositar o nosso produto", afirmou Pozzobon.
Mesmo quem não vendeu diretamente para a Seara pode ser lesado, de acordo com os agricultores. "Tem produtor que vendeu para a cooperativa ou outra empresa, e esta vendeu para a Seara. Se essa empresa não recebe da Seara, vai buscar recurso onde para pagar o produtor? Isso vira um círculo negativo", disse Pozzobon. "Estamos sem alternativa. Temos que esperar a recuperação judicial", desabafou Risso.
Produtores da região dos Campos Gerais estão na mesma situação. De acordo com o agricultor Jurandir Proença Lopes, dono de cinco fazendas nos municípios de Ventania, Curiúva e Figueira, há produtores e pequenas cooperativas correndo o risco de fecharem as portas por causa do prejuízo. "Teve gente que entregou 100% da soja para Seara", contou.
Lopes entregou em torno de 30% da sua produção à empresa. Em quase 10 anos negociando com a Seara, contou que nunca ficou sem receber. "Estava entregando soja dois dias antes do pedido de recuperação judicial. Eles me mandaram o comunicado pelo e-mail", disse.
O produtor pretende renegociar as dívidas no banco e conseguir recursos para o custeio da próxima safra, porque não tem esperança de receber o débito tão cedo. "Meu advogado falou que isso pode demorar uns 10 anos", afirmou.
A FOLHA procurou os advogados da empresa, João Tavares de Lima Filho e Fabrício Massi Salla, para comentarem a situação dos agricultores, mas até o fechamento desta edição eles não retornaram as ligações.


"Muitos produtores deixavam a soja na Seara de um ano para o outro. Para muitos era como uma poupança", disse João Dimas Pozzobon


RECUPERAÇÃO JUDICIAL 
A Seara entrou com pedido de recuperação judicial no dia 20 de abril no Fórum de Sertanópolis. Até o final da tarde desta terça-feira (2), a juíza Karina de Azevedo Malaguido ainda não havia proferido uma decisão.
O débito da empresa chega a R$ 2,6 bilhões, sendo que R$ 2,1 bilhões são legalmente cobertos pela recuperação judicial. Os bancos são os principais credores da dívida, com R$ 1,7 bilhão desses débitos. Em 2016, a Seara teve faturamento de R$ 3,5 bilhões.
A agroindústria também demitiu 120 funcionários dos cerca de 800 das mais de 50 unidades nos estados do Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.
"A grave crise econômica que já dura mais de 30 meses e seus impactos negativos sobre a atividade empresarial em todo o território nacional"; "os atrasos em pagamento de créditos tributários que a empresa tem a receber junto ao governo federal"; "a significativa redução de crédito no mercado financeiro brasileiro", "o impacto destes problemas no balanço e no fluxo de caixa da empresa"; e "objetivando preservar a perenidade de suas atividades, a manutenção de empregos e a regularização de débitos juntos a fornecedores, parceiros e terceiros", foram as justificativas para o pedido de recuperação judicial, de acordo com um comunicado enviado no dia 20 de abril.
De acordo com a legislação, o plano de recuperação judicial, caso aceito pela Justiça, deve ser aprovados pelos credores. A lei dá um prazo de 60 dias para a empresa apresentar o plano informando a forma e prazo de pagamento das dívidas. As dívidas trabalhistas têm prioridade. O passivo trabalhista da Seara é de R$1.049.000,00.
Aline Machado Parodi
Reportagem Local/FOLHA DE LONDRINA

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