[Fechar]

Últimas notícias

Combate à corrupção - Dinheiro público, um clamor por vigilância

Abalada por um dos maiores escândalos da história da República, a sociedade brasileira mira os mecanismos de controle do erário. Especialistas ouvidos pela FOLHA opinam sobre como prevenir a ação de organizações criminosas dentro do governo

Luciana Ourique/Agência Brasil
Construção da refinaria da Petrobras, em Abreu e Lima, na Região Metropolitana do Recife: orçamento da obra saltou de US$ 2 bilhões para US$ 18 bilhões e chamou a atenção do TCU
Há quem já considere as consequências da Operação Lava Jato, deflagrada em março pela Polícia Federal, e que resultou na prisão de ex-diretores da Petrobras, a maior empresa pública do País, e de executivos das principais empreiteiras, seja um marco no combate à corrupção no Brasil.

Ainda em andamento, o caso de desvio de recursos na estatal expõe as qualidades e os defeitos da estrutura oficial de controle, que se empenha para criar a cultura da punição no âmbito dos governos.

Nas páginas seguintes, a FOLHA lista mais de 40 escândalos em andamento no País e que vieram à tona a partir de operações da Polícia Federal, um painel que mostra como os crimes contra o patrimônio público estão alastrados pelo País. A maioria envolve licitações fraudulentas e nascem da conexão de empresários inescrupulosos com servidores corruptos. O painel elaborado pela reportagem é apenas uma pequena parcela de uma chaga que sangra cerca de R$ 76 bilhões do dinheiro do contribuinte, números atualizados de uma estimativa feita pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) em 2010.

Para ajudar o leitor a entender as causas desta sangria que prejudica especialmente os mais pobres, a reportagem ouviu um grupo de brasileiros que faz parte de um verdadeiro exército montado pelo Estado para reprimir organizações criminosas que lesam os cofres públicos. E perguntou: afinal, como está esta guerra do bem contra o mal? Como evitar novos "Petrolões"?

"É quase a certeza da impunidade que faz as pessoas agirem como agem. A gente observa em todo o país muitos casos que se revela a corrupção. Até mesmo prisões não são incomuns. Mas isso ocorre num índice baixíssimo", afirma Claudio Esteves, promotor do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). "Há muitos casos que não são apurados, então a corrupção compensa. O risco de punição efetiva é baixo. Este risco tem que ser muito alto", afirma o promotor, conhecido pelo trabalho de investigação no escândalo AMA-Comurb, que abalou Londrina 15 anos atrás, e pelo recente caso de desvios na Prefeitura de São Jerônimo da Serra (Norte Pioneiro).

Claudio Weber Abramo, diretor executivo do Transparência Brasil, site especializado em fiscalizar gastos públicos em todas as esferas, acredita que o escândalo na Petrobras traz uma dura lição à sociedade brasileira, que para ele terá que debater algumas questões hoje consideradas práticas comuns no ambiente político. "Ainda temos muito a caminhar. É preciso aprimorar o combate. A começar pela tolerância à prática do loteamento do governo pelo critério partidário. Este é um problema fundamental. O Estado é invadido por interesses partidários, que, como cidadãos, não são os nossos. É gente ocupando o cargo para se locupletar dele e isso afeta a capacidade gerencial do Estado, atrasa decisões importantes", afirma o ativista. "E quanto mais atrasado e menos ágil o Estado for, mais os partidos aproveitarão".

O ex-senador por Pernambuco e ex-ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), José Jorge, avalia que a fiscalização dos tribunais de contas poderia ser mais efetiva do que é hoje, embora lembre que no caso do Petrolão, o TCU agiu corretamente. "A política do tribunal deveria ser mais voltada para a fiscalização em si. Tem muito ministro e muita gente da equipe técnica que gosta de fazer seminários e outros eventos deste gênero voltados à discussões de políticas públicas. Isso é útil. Mas mais útil ainda é a fiscalização", disparou.

Ainda assim, sem a efetividade ideal da autoridade contábil, Jorge conta um episódio que ilustra a importância dos mecanismos de controle e o quanto eles podem ou não serem decisivos para coibir os crimes de colarinho branco. "Em 2009, o TCU enviou ao Congresso um relatório pedindo que fosse suspenso repasse de dinheiro para a obra da refinaria Abreu e Lima, devido a irregularidades constatadas pelos ministros do órgão. E o que aconteceu? O Congresso aprovou este relatório do tribunal e incluiu como anexo na Lei de Diretrizes Orçamentárias a determinação de que não deveria mais haver repasse de recursos para a obra. A lei foi aprovada. Ou seja, a rejeição foi aprovada pelo TCU e pelo Congresso", explica. "Na época, o presidente Lula e sua ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, vetaram este artigo", conta o recém-aposentado ministro do TCU. "E então os repasses continuaram. Neste caso, o veto foi uma decisão grave. Ainda mais porque não tomaram nenhuma providência. Podiam ter demitido o diretor, Paulo Roberto (Costa, ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras), por exemplo. Podiam ter criado uma sindicância. Neste caso, não faltou legislação, nem fiscalização. Faltou uma decisão política do Executivo e a situação piorou", avaliou.

fonte - folha de londrina
Lúcio Flávio Moura
Reportagem Local
UA-102978914-2