[Fechar]

Últimas notícias

EQUILÍBRIO - Chuvas e abalos impõem lições a Londrina

Excesso de água e terremotos de 2016 mostram que a cidade e toda a região precisam repensar o método construtivo e a maneira como lidam com o meio ambiente

 

No final do ano passado, parte de Londrina tremeu. O epicentro foi o Jardim Califórnia, zona leste. Mas os tremores – acompanhados de estrondos – irradiaram também para bairros vizinhos, como Vila Brasil e Jardim Igapó. Então inédito por aqui, o fenômeno alcançou Rolândia, Arapongas e Apucarana. Paredes de milhares de casas racharam. Moradores ficaram desesperados.
Londrina ainda buscava explicações para os abalos sísmicos – com picos de 1,8 grau na escala Richter – quando, em janeiro, chuvas incessantes arrasaram estruturas urbanas e rurais de uma maneira jamais testemunhada pelos habitantes do município. Foi o janeiro mais chuvoso na história das medições, iniciadas em 1976, com 417,8 milímetros de água, diante de uma média de 200 mm.
Já encharcada pela chuvarada de novembro (516 mm) e dezembro (390,6 mm), que já havia levado a uma saturação completa dos solos, a terra começou a ceder, no campo e na cidade, depois de um toró inacreditável em 12 de janeiro, com 223,6 mm em 24 horas – além dos 81 mm do dia anterior. Resultado: prejuízos públicos estimados em R$ 93 milhões, com a destruição de pontes, ruas, viadutos, escolas, parques.
O que aprendemos com essa dura lição? Como combater o potencial destrutivo de eventos climáticos como este El Niño de 2016?
Especialista e pesquisador de solos e fundações, o engenheiro Carlos Costa Branco, professor no Departamento de Engenharia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), aponta que a "coincidência" de muita chuva com tremores inéditos, localizados, conduz a uma importante lição: "Deveríamos repensar a forma como construímos nossos imóveis", observa. "É notório que, com água, nosso solo se movimenta, cede."
O alerta de Costa Branco tem como base as características da terra vermelha do Norte do Paraná. Originado em rochas vulcânicas basálticas, esse tipo de solo tem um índice nível 2 de vazios, uma escala aplicada pela Geologia e pela Engenharia para estabelecer o grau de porosidade, permeabilidade e resistência à água – fator decisivo, portanto, para os métodos de construção e obras.
Na composição da terra vermelha, é possível afirmar que em cada parte sólida de solo estão duas outras partes vazias, preenchidas somente por ar. É como se em cada punhado de terra vermelha houvesse o equivalente a dois punhados de espaços vazios no meio das partículas de solo – uma porosidade de 65%.
"É por isso que se chama solo colapsível", esclarece o professor da UEL. "Quando é preenchido por água, sofre o efeito de recalque. É a tradução exata do que ocorre quando a população diz que o solo cedeu ou assentou", diz Costa Branco, para quem essa seria a causa principal das rachaduras em residências de toda a região.

Norma não ajuda

A Norma Brasileira Regulamentadora de Fundações (NBR 6122), documento com parâmetros de referência para "fincar" qualquer obra no solo, de acordo com o pesquisador, não ajuda a orientar sobre como construir em solos que possam ser saturados por água ou sujeitos a colapsos por pequenos tremores.
"Sobre o solo colapsível, a Norma diz que para instalar fundações é preciso considerar a possibilidade de encharcamento da terra por vários motivos", afirma Costa Branco. "No entanto", ele acrescenta, "não há nenhuma indicação de qualquer método construtivo para essas situações. Nada!"
Desde antes de 1998, quando a UEL abriu um laboratório de experiências para testes de carga em solos, Carlos Costa Branco atua em pesquisas para avaliar como a água pode fragilizar fundações na porosa terra vermelha. "O que descobrimos é que uma fundação convencional em solo a ser encharcado pode ter uma estrutura cuja resistência cai à metade se compararmos com o solo sem tanta água", exemplifica.
Para ele, o método construtivo usual é o que provavelmente explicaria as rachaduras em milhares de casas no Norte do Paraná, inclusive em Londrina. "Precisamos aprender com os erros, achar soluções para esses novos cenários e passar a construir melhor", propõe.
Marcelo Frazão
Especial para a FOLHA DE LONDRINA
UA-102978914-2