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Meta 4 estremece relações entre governo e universidades

As relações entre a UEL (Universidade Estadual de Londrina) e o governo do Estado, que já estavam conturbadas, ficaram estremecidas na última semana após o bloqueio de R$ 6 milhões da instituição. Diante da negativa da universidade em aderir o Meta 4, sistema de gestão em recursos humanos, a Comissão de Política Salarial do governo decidiu pelo contingenciamento dos recursos próprios da instituição, medida que também atingiu a UEM (Universidade Estadual de Maringá) e a Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná).

A UEL não abre mão de gerenciar a quantia de R$ 746 milhões da folha de pagamento dos servidores, repassada pelo governo. Para a universidade, trata-se de uma questão de autonomia garantida pela Constituição. Com parecer contrário do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que observa a necessidade das IEES (Instituições Estaduais de Ensino Superior) também adotarem o software padrão dos demais órgãos públicos paranaenses, a UEL recorreu à Justiça, em ação conjunta com a UEM.

O reitor em exercício da UEL, Ludoviko Carnasciali dos Santos, disse que, em 1992, o TJ-PR (Tribunal de Justiça do Paraná) deu ganho de causa à UEL em uma ação parecida contra o governo estadual. "Era um caso bem semelhante em que o TJ entendeu que a autonomia da universidade estava em risco. Então, nesta Reclamação, pedimos que essa decisão de 1992 seja respeitada", pontua Santos. A reitora Berenice Jordão, da UEL, acompanhada do reitor Mauro Baesso, da UEM, esteve nesta segunda (5) na Casa Civil, em Curitiba, para tentar uma saída para o impasse. Para Santos, ao forçar as universidades a adotar o Meta 4, o governo pretende assumir o controle político das sete instituições. Quatro das sete universidades estaduais já utilizam o Meta 4 ou estão em processo de implantação.

O pró-reitor de Recursos Humanos da UEL, Leandro Altimari, diz que o recurso da folha de pagamento da universidade passa por três mecanismos de controle que fornecem todas as informações necessárias para garantir a transparência. O software utilizado pela UEL, o Ergon, segundo ele, é mais eficiente que o Meta 4, e permite maior controle da gestão administrativa, financeira e acadêmica. "Temos 48 sistemas interligados a ele. Todas as informações são facilmente filtradas em pouco tempo", diz.

Ele acrescenta que, com os dados em mãos, todas as informações são encaminhadas ao governo pelo RMIP (Remessa Mensal de Informação de Pessoal). "Aqui transmitimos todas as informações, os valores empenhados do servidor, incluindo salários, benefícios, férias. É tudo imediato", detalha. Por último, Altimari diz que os dados são encaminhados ao TCE pelo Siap (Sistema Integrado de Ato de Pessoal). "Além dessas três ferramentas, ainda mantemos nosso Portal da Transparência disponível para qualquer cidadão no nosso site. Não se pode falar em caixa-preta ou que estamos escondendo algo", salienta.

Altimari também comenta sobre os salários na instituição. "Existe uma ideia de que os supersalários predominam na UEL, o que não é verdade. Existem, sim, alguns servidores mais antigos que acumularam benefícios de toda uma vida de trabalho aqui, mas são minoria", argumenta. "Todos os pagamentos e salários e benefícios são garantidos por lei. Se os valores não forem respeitados, a universidade terá outros passivos com pagamentos de ações judiciais", expõe.

ORÇAMENTO
A UEL trabalha com orçamento de R$ 920 milhões. Do total, R$ 763 milhões são de repasses do governo estadual, sendo R$ 746 milhões de gastos com o pessoal e R$ 16 milhões para o custeio de todas as atividades. Diluído, isso representa R$ 1,3 milhão por mês."É muito pouco para arcar com todas as despesas de ensino, projetos sociais, saúde, obras. Para tudo isso, seriam necessários cerca de R$ 3 milhões por mês", lista a pró-reitora de Planejamento, Cleuza Kuwabara. A participação porcentual do custeio nos repasses feitos pelo governo caiu de 8%, em 2012, para quase 4%, em 2016.

O diretor de Orçamento da UEL, Antonio Alves de Lima Neto, explica que, no ano passado, a UEL captou R$ 115 milhões de órgãos de fomento, que incluem o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e Fundação Araucária. Segundo ele, os recursos são específicos para os projetos de pesquisa e não podem ser utilizados para outros fins.

O restante do orçamento é completado pela geração de recursos próprios, oriundos de taxas de vestibulares, cursos de especialização e outros meios. "É de onde tiramos o dinheiro para aportar nas despesas que temos. Se a situação continuar assim, em breve não teremos mais de onde tirar esses recursos", alerta Kuwabara. Lima Neto lembra que, há 20 anos, o orçamento da UEL era equivalente ao da Prefeitura de Londrina. O orçamento geral do Município de 2017 é de R$ 1,8 bilhão. "Se formos buscar uma explicação, com certeza fomos nós que regredimos", analisa.

UEM vincula qualidade a gestão própria 
De acordo com o vice-reitor da UEM (Universidade Estadual de Maringá), Júlio Damasceno, os índices expressivos obtidos pela instituição em nível nacional – 6ª melhor estadual do País – são resultado de uma política arrojada de recursos humanos gerenciada por uma equipe "altamente qualificada". "Isso não é reflexo de investimento em infraestrutura proporcionado pelo governo do Estado. Nunca foi", argumenta.

Para Damasceno, o Meta 4 parece mais uma estratégia para que o governo passe a gerir as folhas de pagamento das universidades, controlando a concessão de progressões e promoções nas carreiras de docentes e agentes universitários, como já funciona na Uenp (Universidade Estadual do Norte do Paraná) e na Unespar (Universidade Estadual do Paraná). "A notícia que temos é que nessas duas universidades os processos são lentos e burocráticos, no que tange às implementações de promoções e progressões das carreiras docentes e dos agentes universitários, o que pode gerar ações judiciais", afirma Damasceno.

O vice-reitor lembra que Uenp e Unespar já foram criadas dentro do Meta 4, em funcionamento em todos os órgãos do governo desde 2012. "É um sistema que foi implantado de forma arbitrária. Ambas já nasceram sem autonomia. Nós desejamos que a Unespar e a Uenp se tornem referência nacional, mas infelizmente, elas não podem sonhar em se tornar, por exemplo, uma UEM amanhã, porque esse sistema de gestão não permite", avalia.

De acordo com a UEM, o bloqueio de mais de R$ 18 milhões já começa a impactar na rotina da universidade. Em alguns campi, já há suspensão na entrega da alimentação, serviço que é subsidiado pela administração da UEM. No campus do Arenito, em Cidade Gaúcha, a interrupção do benefício deve se dar nos próximos dez dias. No campus de Goioerê não há carro disponível, pois falta dinheiro para pagamento das oficinas de manutenção dos veículos. No campus de Maringá, o Restaurante Universitário, que serve 1,8 mil refeições por dia, tem estoque suficiente só para pouco mais de duas semanas de funcionamento.

A reportagem entrou em contato com a Unioeste - também afetada pelos contingenciamentos de recursos por não aderir o Meta 4 - mas a assessoria de imprensa não designou nenhuma fonte para comentar o assunto. Já a Uenp e a Unespar informaram que se pronunciariam sobre o Meta 4 nos próximos dias. (C.F.)
Celso Felizardo
Reportagem Local/FOLHA DE LONDRINA

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